O poeta estadunidense Counte Cullen foi um dos muitos poetas afrodescendentes que apareceram nas bancas e nas livrarias, após a eclosão do Negro Renaissance, movimento afroamericano, surgido em New York , na década de 1920, no bairro do Harlem, o gueto dos negros estadunidenses que vieram do Sul do país por causa do término da Guerra de Secessão. Não ficou tão conhecido como o seu compatriota Langston Hughes (The Weary Blues, 1926) ou mesmo como o poeta Claude MacKay (If We Must Die, 1919, e Harlem Shadows, 1922), um dos precursores desse “Renascimento Negro” do Harlem.
Não foi à toa que movimentos posteriores como o Indigenismo haitiano ou o Negrismo cubano (oqual nos legou um poeta do porte de Nicolas Guillén, Motivos de son, 1930) ecoaram também na Europa com a Negritude francófona em Paris (Aimé Cesaire, Leopold Sedar Senghor e Leon Damas). Ecos do Negro Renaissance também são sentidos nos poemas do brasileiro Solano Trindade (Cantares do meu povo, 1961), a quem os estudiosos apontam como o primeiro em nossas letras a assumir essa mesma postura dos escritores negros estadunidenses; a despeito, é claro, de ter havido em nosso país , no século XIX, alguns precursores dessa atitude, um deles é o poeta Luiz Gama.
O certo é que as vozes negras desses poetas todos cantam, a partir da década de 1920, quase em uníssono, tanto a assunção da negritude e da herança africana quanto as queixas de uma gente atingida pela Diáspora trágica, que foi marcada na pele de povos da África, em tantos países, sobretudo, nos das Américas. Canta-nos, Countee, o teu canto negro:
INCIDENT
Once riding in old Baltimore ,
Heart-filled, head-filled with glee,
I saw a Baltimorean
Keep looking straight at me.
Now I was eight and very small,
And he was no whit bigger,
And so I smiled, but he poked out
His tongue and called me: “Nigger”.
I saw the whole of Baltimore
From May until December:
Of all the things that happened there
That’s all that I remember.
(Countee Cullen)
INCIDENTE
Certa vez andando em Baltimore,
Tão alegre, em regozijo,
Vi um baltimoreano
Mantendo o olhar em mim, fixo.
Eu tinha oito e era pequeno,
E o seu tamanho era o mesmo;
Então eu sorri, mas ele
Deu-me a língua e disse: “Negro”.
Eu vi Baltimore toda
Desde maio até dezembro:
De tudo o que ocorreu lá,
Isso é só o que eu lembro.
(Tradução de Luiz Filho de Oliveira)