terça-feira, 25 de outubro de 2011

MICROANTOLOGIA QUASE TODA ERÓTICA DE MICROS E ROSAS




I. Pablo Neruda


LOS VEINTE POEMAS

1

Cuerpo de mujer, blancas colinas, muslos blancos,

te pareces al mundo en tu actitud de entrega.
Mi cuerpo de labriego salvaje te socava
y hace saltar el hijo del fondo de la tierra.

Fui solo como un túnel. De mí huían los pájaros
y en mí la noche entraba su invasión poderosa.
Para sobrevivirme te forjé como un arma,
como una flecha en mi arco, como una piedra en mi honda.

Pero cae la hora de la venganza, y te amo.
Cuerpo de piel, de musgo, de leche ávida y firme.
Ah los vasos del pecho! Ah los ojos de ausencia!
Ah las rosas del pubis! Ah tu voz lenta y triste!

Cuerpo de mujer mía, persistirá en tu gracia.
Mi sed, mi ansia sin limite, mi camino indeciso!
Oscuros cauces donde la sed eterna sigue,
y la fatiga sigue, y el dolor infinito.


(Los Veinte Poemas de Amor y una Canción Desesperada, 1923-1924.)



II.Manuel Bandeira



Evocação do Recife

Recife
Não a Veneza americana
Não a Mauritsstad dos armadores das Índias Ocidentais
Não o Recife dos Mascates
Nem mesmo o Recife que aprendi a amar depois
         Recife das revoluções libertárias
Mas o Recife sem história nem literatura
Recife sem mais nada
Recife da minha infância

A rua da União onde eu brincava de chicote-queimado e partia as vidraças da casa de                                                                                                              [dona Aninha Viegas
Totônio Rodrigues era muito velho e botava o pincenê na ponta do nariz
Depois do jantar as famílias tomavam a calçada com cadeiras mexericos namoros risadas
A gente brincava no meio da rua
Os meninos gritavam:

Coelho sai!
Não sai!

A distância as vozes macias das meninas politonavam:

Roseira dá-me uma rosa
Craveiro dá-me um botão
(Dessas rosas muita rosa
Terá morrido em botão...)

De repente
               nos longos da noite
                                                                                            um sino

Uma pessoa grande dizia:
Fogo em Santo Antônio!
Outra contrariava: São José!
Totônio Rodrigues achava sempre que era São José.
Os homens punham o chapéu saíam fumando
E eu tinha raiva de ser menino porque não podia ir ver o fogo.

Rua da União...
Como eram lindos os montes das ruas da minha infância
Rua do Sol
(Tenho medo que hoje se chame de dr. Fulano de Tal)
Atrás de casa ficava a Rua da Saudade...
                                                                        ...onde se ia fumar escondido
Do lado de lá era o cais da Rua da Aurora...
                                                                        ...onde se ia pescar escondido
Capiberibe
- Capiberibe
Lá longe o sertãozinho de Caxangá
Banheiros de palha
Um dia eu vi uma moça nuinha no banho
Fiquei parado o coração batendo
Ela se riu
                                                                Foi o meu primeiro alumbramento
Cheia! As cheias! Barro boi morto árvores destroços redemoinho sumiu
E nos pegões da ponte do trem de ferro os caboclos destemidos em jangadas de bananeiras

Novenas
                        Cavalhadas

E eu me deitei no colo da menina e ela começou a passar a mão nos meus cabelos
Capiberibe
Capiberibe

Rua da União onde todas as tardes passava a preta das bananas
Com o xale vistoso de pano da Costa
E o vendedor de roletes de cana
O de amendoim
          que se chamava midubim e não era torrado era cozido
Me lembro de todos os pregões:
             Ovos frescos e baratos
             Dez ovos por uma pataca
Foi há muito tempo...

A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros
Vinha da boca do povo na língua errada do povo
Língua certa do povo
Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil
             Ao passo que nós
             O que fazemos
             É macaquear
             A sintaxe lusíada
A vida com uma porção de coisas que eu não entendia bem
Terras que não sabia onde ficavam
Recife...
                Rua da União...
                                           A casa de meu avô...
Nunca pensei que ela acabasse!
Tudo lá parecia impregnado de eternidade
Recife...
               Meu avô morto.
Recife morto, Recife bom, Recife brasileiro
como a casa de meu avô.
                         


 Rio, 1925.

(Libertinagem, 1930.)



III. Martha Medeiros


puxei a manga da camisa um pouco pra cima
perto do cotovelo,e abri o botão calmamente
como se fizesse isso todo dia na tua frente
não te olhei como amiga nem professora
e não liguei para a pouca idade que tinhas
eu era mais madura e você mais coerente
tinha certeza de tudo mas não se mexia
passei a mão no teu cabelo
te beijei na testa, no queixo
beijei tua nuca e tua boca
e fui a primeira mulher nua da tua vida


(Persona non grata, 1991.)




IV. Luiz Filho de Oliveira


Versos a uma mulher em pelos (em textos de Pablo a Manuel)*

a primeira mulher adulta
despida à minha vida
não me-veio versos nus
ou alumbramentos
foi nua revista a mim –
menino – por uma libertina
oferecida:  amiga de umas
intenções quintas!

mas que encontro!
o primeiro de tanto encanto
do lado contra um sexo oposto!
em imagem parada extática era
tão vida a rosa-púbis da estrela!

e a segui-la noutra cena
o cérebro ainda (cores vidas!)
e em seguida – desenhada – foi
arte & libido proibidas (minhas)
mas em papel verde tinta – esquisito!

e que esperança
de tê-la sim (não foto ou gravura)
pu-la em meu rijo pênis jovem!


(Num Porto Maior, que é certamente um Campo Alegre.)


* A Martha, uma poeta sem medos, somente Medeiros.


(Onde Humano, 2009.)
 

2 comentários:

Anônimo disse...

Belos poemas,Poeta! Vc é dessas passoas que a gente não consegue parar de ler.Abraços,Mariano.

Luiz Filho de Oliveira disse...

Leitores; eis o quem procuramos escrevendo, Mariano. Grato pela leitura sua.