quinta-feira, 28 de julho de 2011

Doutor Gojoba, do Primavera pro mundo





Dentro da política habitacional planejada pelo Banco Nacional da Habitação (BNH) para Teresina, a construção do conjunto Primavera, em 1966, foi a terceira obra desse tipo na capital piauiense, antecedida que foi pelos conjuntos Tabuleta e São Raimundo. O Primavera fez, pois, parte da estratégia do governo para atrair a população do interior do Piauí para a “Cidade Verde”, como Coelho Neto a-cunhou (que trocadilho escroto!). Isso deu certo. A partir desse período, a população da “primeira capital planejada do Brasil” passou de noventa e tantos para quase quatrocentos mil habitantes. Somente nos dois primeiros anos desse projeto, de 1966, época do primeiro conjunto habitacional da capital, até 1968, quando foi construído o Parque Piauí, o quinto conjunto, foram vendidas à população cerca de três mil unidades habitacionais. Haja casa para tantos casos!
O meu, o-escrevo: a atração de minha família, vinda do Alto Longá em 1974, também se-deu por esses planos e planejamentos. É. Também, porque mamãe passou um tempão nas oiças de papai pedindo pra ele nos trazer para a capital, para estudar. Ladainha de mãe, coro de professora; alguns de vocês sabem. Persistência, mundivisão, sabença. Assim – ou asnão! –, o Primavera entra nisso, sim; e entramos nele em um Misto (um caminhão com uma boleia de passageiros e uma outra parte, uma carroceria para cargas) fretado por meu pai para trazer-nos e a nossa muda, que dizia tudo – éramos “matueiros”! –, a esta Canaã urbana. Ao chegarmos à “Capital Mafrense”, nossa família, nove pessoas, foi morar em frente às Quadras B e C desse conjunto, no bairro Primavera, que surgiu, claro, a partir daquele.
Foi, então, que o nosso cenário mudou completamente: de bois e bodes a carneiros e cabras e galinhas, que nos-rodeavam na Fazenda Criolis, de nossa família, passando pelas paisagens em volta da casa na rua..., em Alto Longá, chegamos aos “cabras de peia”,  às comadres e aos “caras” desta cidade. Cenário novo; novas personagens. E, ainda mais, um novo palco para nós: papai comprou uma casa nova na outra esquina do mesmo quarteirão onde morávamos, pois a que habitávamos era de aluguel. Obras, nessa nova casa, ainda inacabada: paredes sem reboco, piso bruto, banheiro externo, cerca de arame... É melhor chamar um pedreiro. Obragem.
Era uma vez, então, o Gojoba, o pedreiro da área, do bairro, ou melhor, do conjunto. Gojoba morava lá embaixo; é fácil chamá-lo. “Às vezes, até no domingo dá, se eu não tiver bebendo”. Gojoba era querido de todos, principalmente, dos filhos do seo Domingo, o alfaiate. Netão, Pedro Cão, Zé “Orea” e Paulo Cenoura, se tiverem bebendo, o Gojoba tava lá. E foi desse jeito que aconteceu uma anedota conhecidíssima no Primavera, entre os  moradores das décadas de 70 e 80, claro. Ela virou até piada na boca do humorista Dirceu Andrade. É, foi hilário. Caso de anedota mesmo. História pra boi sorrir!
Mas não vou contá-la literalmente; tentarei somente escrever o que possivelmente tenha havido. Não sei se o Pedro Cão já havia-se-formado ou se ainda estava cursando Medicina na UFPI. O certo é que haveria uma festa, parece-me que ligada aos acadêmicos desse curso. Pedro Cão, claro, deveria ir. Aliás, sempre ia a esse tipo de comemoração. Só que a decisão foi tomada numa bebedeira da turma, talvez na quitanda do seo Juarez ou, quem sabe, em frente de casa, com a criatividade de se-misturar a bebida destilada com algum refresco de fruta (o maracujá, por exemplo, dava um coquetel excelente), para fazer o bate-bate, ou com qualquer refrigerante, dependo da cachaça utilizada, para fazer a cuba, o hi-fi (pra minha turma, simplesmente, "vodka com Fanta laranja"). Nas farras mais baquianas, o Gojoba dava o barro de sua graça, e o pessoal socializava a bebida. Pois é, numa dessas, a turma decidiu que levaria Gojoba para uma festa. Aliás, Doutor Gojoba; era assim que eles iriam apresentá-lo a todos. Nisso, certo, havia uma boa dose (dá-lhe, cana!) de preconceito ou de previdência quanto a possíveis preconceitos de outras pessoas. Afinal, Gojoba era um simples pedreiro. É, Gojoba ia ser o Doutor Gojoba, o que é que tem?
Botou uma beca o Gojoba, e vamos lá. Festa vai, bebidas vêm; Gojoba já estava entrosado com todos, inclusive, com as colegas de curso de Pedro Cão. Era Doutor Gojoba pra cá; Doutor Gojoba pra lá. “Doutor Gojoba, o senhor acredita que...”. “Doutor Gojoba, o senhor já estudou aquele caso...”. “Doutor Gojoba...”. Gojoba, a princípio, achou graça dessa parada de “Doutor”. “Porra, aqui tá chei de coroa!”. Curtiu à vontade, principalmente, porque as acadêmicas o acharam muito engraçado. E a bebida descendo a goela, gelada ou quentíssima. E a cabeça foi enchendo. “Doutor Gojoba, cadê seu copo?”. “Doutor Gojoba, espere mais um pouco”. “Doutor Gojoba, isso; Douto Gojoba, aquilo”. Gojoba ficou cheio disso e se-levantou com a fala-desfecho da anedota:
– Que porra de Doutor Gojoba! Que nada! Eu sou é pedreiro e vou é embora; amanhã eu tenho que acordar cedo, pois eu tenho é três metros de muro pra levantar!

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Poesia: um dos ondes humanos


catalogação da obra ou o poema dá obragem

poesia universal
poesia via-lacteana
poesia sistêmico-solar
poesia terrenumana
poesia sul-ocidental
poesia sul-americana

poesia brasileira
poesia nordestina
poesia meio-nortista
poesia piauienssísima
poesia campurbana
poesia todo-bairrista

poesia caseira
poesia de gabinete
poesia de mesa
poesia de papel
poesia de tela:
poesia mesma!

(Em qualquer desses lugares e neles todos.)


Luiz Filho de Oliveira. Onde Humano. Teresina: Nova Aliança, 2003.


sexta-feira, 8 de julho de 2011

ESTOU “DIRETAMENTE INTERESSADO” EM METADE DE SUA CASA


Desde que nos disponibilizaram esta promoção “a folote”, que é a internet, nunca mais fiz leituras de jornais impressos como o fazia anteriormente à assunção dessa “atitude suspeita”. É, jornais online, como o JB, a Folha, o Globo, o New York Time, o Le Monde, o El País, e o Meio-Norte, claro (não escute o escuro da minha opinião, não), a preço de lan house ou a de modem pré-pago ou de conta mensal com “os gigantes da rede” é algo que não se deve deixar de aproveitar mesmo. Tudo bem, há diferenças. Apois. Isturdiinha (sábado, 03/07), eu estava folheando o jornal Meio-Norte impresso (a redundância é um exemplo pros meus alunos; mania de professor!), aproveitando o que a padaria onde tomo café oferece “de grátis”, e não é que me deparei com este “argumento rabulesco”, meu povo: o plebiscito sobre a criação do Gurgueia deve ocorrer apenas nas cidades que comporão o suposto Estado, que, segundo o “genial” autor dessa tese, é, sim, a “população diretamente interessada” nessa divisão, conforme reza a Constituição.
Não, não, o senhor está certo, “doutor” (pus as aspas porque não sei se o ilustre advogado, que é o autor da tese aludida acima, é, de fato – e de direito! –, pós-graduado com um doutoramento). O senhor está certo, porque não tenho dúvidas de que a maioria da população dessa região está realmente “interessada” nessa divisão do Piauí em dois; o que se dirá dos políticos! Mas não quero discutir, aqui, essa questão secundária; o que venho defender, com este meu texto, é algo primevo (daqui, do Primavera, ou de lá, do primitivo das Capivaras!), é o meu direito de estar “diretamente interessado” em ser consultado se houver um plebiscito acerca dessa separação, separatistas! Não, data venia, “doutor” – e dados (data!) venham! –, eu não concordo com o senhor nem com os sul-piauienses (por que não denominam o novo Estado de Piauí do Sul, como o querem os sul-maranhenses a respeito do Estado deles?). E, para “marcar o território" dessa minha oposição, gostaria de propor-lhe uma questão satírico-jurídica, que eu chamarei de “A questão de Hermanomeu” (como falei, essa titulação é só para dar ares ao texto de “profundo”, “sapiente”, “intelectual”, manca?).
Explico; melhor, argumento, ou melhorinda, proponho, merimão: se o senhor tivesse um imóvel ( bom, uma casa!) registrado em seu nome e lhe fosse proposto dividi-lo entre mim e o senhor, nas mesmas proporções em que se quer dividir este Estado em Piauí e Gurgueia, quem deve ser consultado para decidir essa questão, somente eu ou eu e o senhor? Que bom que o senhor tem a opinião de que deve ser somente eu quem deva decidir um tal “interesse público”. Estou precisando mesmo de uma “verba” como essa. Quanta palavra e quanto número vão ser gastos! Estava precisando disso. Mas não se preocupe, não há possibilidade de “coabitarmos o mesmo lar”; por isso e pela legítima “incompatibilidade de gênios”, venderei a minha parte a alguém, e a pessoa que tem a preferência é o senhor mesmo. Pra ficar na paz, mano. E digo mais: não se preocupe, pois há “saída jurídica” para uma proposição tão tola quanto essa; ainda mais, que é feita por um estudante graduado em Letras, que efeito terá? Deixa quieto.
Contudo, quero continuar defendendo meu grito com tudo, na tubada deste texto. Rápido e rasteiro. Grosso modo, grosseiro. Mas o ser ruda a minha opinião não a desqualifica nem a “tipifica criminalmente”. E menos: citar o artigo, o parágrafo, o inciso ou a alínea da Constiuição Federal ou, como queira o advoguês, da Carta Magna não dá autoridade a seu argumento, seo dotô. Arrepare que, com isso, o siô pode estar até rabulando, e isso é feio se é assim (se é assado não sei, mas a batata está...). Apois. Na Constituição, a expressão “a população diretamente interessada”, no caso de nosso (?) plebiscito, refere-se à do Piauí. Por quê? Ora, se a Constituição é Federal e a divisão de que trata essa questão é a de um Estado da Federação; então, a quem isso “interessa diretamente”, senão à população desse Estado, nesse caso, a do Piauí (afinal, cineasmente falando, essa pôrra ainda nem foi dividida!)? Assunte: eu já metendo gente (olha o respeito, nem pense num “em” nesse lugar!) importante nessa pendenga. Vixe, deus-me-livre de me topar com o Ancião. Não quero briga, mestre; isso só se não tiver jeito. Mas eu tô é brincando mesmo.
Escrevo: pilera à parte, não tem nadazaver esta minha opinião com despeito ou falta de respeito. Hem-hém, e este cabôco do interior do Piauí (ilustres Piaguí e Tabajaras!) é besta por acaso? Não sou nenhum bodim pra querer caçar conversa com um “doutor da lei”, nem com um Mestre das Letras. Eu mesmo não quero papo: o meu ponto final nessa questão abre as reticências para o debate de quem quiser. Minha opinião é esta: eu devo, sim, ser consultado sobre essa divisão do Piauí, constitucionalmente falando. E não vou mentir (mesmo sem ter medo dessa parada pagã, cristã ou muçulmana de inferno): sou contra. E pronto. E ponto (senão, me dá metade da sua casa, dotô). Eita terrinha quintura; o mais besta, aqui, é presidente de qualquer furdunço.



Por Luiz Filho de Oliveira, poeta de um Estado só e de dois livros apenas, BardoAmar e Onde Humano.