segunda-feira, 29 de março de 2010

Para decifrar este poema, é necessário ir além do príncipe pequeno, ao encontro do rei




oráculo principal

bem dentro de ti campo
este canto de trigo enigma:
cativa-me-devora!


(Luiz Filho de Oliveira. BardoAmar, Teresina: Edição do Autor, 2003.)

segunda-feira, 22 de março de 2010

Mais valem dois poemas na tela da Terra do que duas aves voando sem chão



Solos da manhã sem Sol abrasador em Teresina

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Em português é mesmo isto:
se o bem-te-vi, vezes seguidas,
mal sentado me-vir sozinho aqui,
repetirá bem estridente seu hino
a plenos pulmões tão pequenos
(que não foi deus porra nenhuma
que criou tal corpo complexíssimo!).
Acredito sim, diz a mim: bem me-viu.

Às voltas então com a minha língua,
em outro galho da árvore vizinha,
incontinenti sola a rola pequenina
fazendo-me ouvir, como na fazenda,
as coivaras das queimadas apagando.
Alvíssaras a quem ouvir teu canto
nesta terrinha, para nós, tão grande,
pelo poema ecoando-se gigante.



Num canto maior à tarde um poeta vida uma ave


Primavera em maio
meu bairro exala um canto
e eu canto outra Fênix


Do ninho no galho
da árvore a ave canta
e encanta nova mente:


Fogo apagou! (cinzas)
Fogo apagou! (ChiSpaS)
Fogo apagou! (VIDA)





(À mesa do quarto, na cidade abaixo do universo.)

quarta-feira, 17 de março de 2010

A Corrida MAIÚSCULA: mulheres que ganharam a direção dos carros



Por estes dias ou "isturdia" (nacionais, internacionais e mundiais) em que a Mulher (com M MAIÚSCULO!) é homenageada e também a poesia (14 e 21 de março, respectivamente, dia nacional e dia mundial da poesia), fiquei tentando escrever algum texto que me-levasse (de novo, Toda-hora?) a contrariar Drummond com o seu “Não faça versos sobre acontecimentos”, difundido a partir de sua “Procura da poesia”, em A Rosa do Povo, de 1945. Como creio que o tema é menos sacal do que o estilo, a expressão, lá fui eu pensando em juntar tudo isso num só acontecimento: a São Paulo Indy 300 (vixe, e ainda rima!).

Cheguei a esse denominador incomum, porque o lugar-comum do “primeiro as damas” veio naturalmente em primeiro lugar por conta de uma data: 8 de março. Porém, não queria contrariar 100% o itabirano; então, conclui que não escreveria nem no dia oito nem no dia catorze de março. Foi aí que Millôr Fernandes entrou nessa confusão temática, pois, pensando em quem homenagear, como exemplo de Mulher, cheguei ao nome de Ana Beatriz Caselato Gomes de Figueiredo ou somente Bia Figueiredo, a primeira mulher brasileira a fazer parte de uma categoria tope do automobilismo mundial. Melhor ainda: o aniversário dessa piloto brasileira é no dia 18 de março. Parabéns, Bia.

Mas, e o Millôr?! Explico: quando cheguei a Bia (leiam que não foi “na”), lembrei-me de um texto do Guru do Méier, publicado originalmente na Veja, em 1º de outubro de2008, em que ele vaza sua biles em cima de patetas (como eu) que gostam (alguns até amam) de corrida de automóvel (não precisa de plural pra saber que há mais de um carro, por favor, Millôr) ou, mais particularmente, da Fórmula 1. Pra variar, cheio de verdades, o texto dele; sobretudo, quando lemos o trecho em que está subentendido que ele também fora pateta, mas em outra época, em outro circo, não no da Fórmula 1: “Me lembro de ir de automóvel – as estradas não eram como as de hoje, enfrentá-las, isso sim, era uma aventura – até São Paulo, nos primórdios de Interlagos, pra ver uma corrida ainda emocionante”. É, difícil escapar a esse atavismo da guerra, da disputa (até pela mulher, não pela outra; né, Chico?). Como não gostar de corrida de automóvel? O fato é que Millôr acha que “foi fácil transformar um antigo e emocionante esporte numa papagaiada circense – circo vulgar e mercenário, pura máquina de fazer, e/ou lavar, dinheiro”. Tudo bem, isso é verdade. E mais: Barrichello é mesmo um piloto com dois neurônios (o Tico e o Teco), que só andam brigando. Mas a emoção também cresceu em velocidade, não foi só em cifras, não.

Claro que, àquela época, no clarão do dia e na velocidade com que corriam, era fácil de identificar os brasileiros Irineu Corrêa, Manuel de Teffé (o Barão), Arthur Nascimento Jr. e Chico Landi ou os estrangeiros Vitório Coppoli, Carlos Pintacuda, Ricardo Carú (“El Eterno Segundo”), José Froilán Gonzalez (o Touro dos Pampas, “El Cabezón”) e mesmo Hellé-Nice, uma puta de uma corredora, em todos os sentidos que a pista der a pista. Contudo, Guru, quem garantiria que realmente eram eles que estavam debaixo daqueles frágeis capacetes? Isso, para usar o seu próprio questionamento acerca da Fórmula 1 hoje. Não tenho certeza de que é Pace, Fittipaldi, Senna, Piquet, “Burrichello”, Massa, etc.? Se não for nenhum deles é um outro homem ou mulher. A façanha deve ser de alguém, mesmo que seja de um robô controlado não sei por quem! Eita rima fácil!

Todavia, nessas vias privadas dum circuito qualquer (poderia ser o Niemeyer-Gávea, Interlagos, Monza, Spa Francorchamps...), podemos dizer que tal carro, por um processo metonímico, é tal piloto porque as cores do time (ou particularmente do capacete, já que as equipes têm dois pilotos) são a extensão sua, sua identidade. Assim como ocorre com os jóqueis nas corridas de cavalo. Quem não se-lembra do rosa da Penélope Charmosa ou do vermelho da Ferrari ou do preto da Lótus de Aírton ou do número dois de Pintacuda em 38 no Rio ou do 8 (?!) de Piquet? Metonímia rasa. Essas cores e esses números eram eles. Sempre vi assim. Se não, paciência. Sou um pateta mesmo. Gosto do circo.

Por isso, a homenagem a esta brasileira, a primeira: Bia Figueiredo. E olha, que ela não fez feio com o seu 13º lugar na São Paulo Indy 300, ficou à frente de Danica Patrick (15ª posição), a americana que é febre lá, entre as meninas; de Simona de Silvestro (16ª), a corredora suíça, e de Mika Duno (21ª), a venezuelana, estreante também. E mais: todas elas levaram voltas do vencedor da corrida; Bia saiu sem levar nenhuma. Valeu, Mulher! Mostrou que tem braço forte e ainda tem muita pista pra passar sob seus pés de borracha, nessa metáfora, que a corrida contra homens e preconceitos.

Já que não terei (possivelmente) a possibilidade de ir ao autódromo, ficarei, pateticamente, em frente à TV vendo os bólidos passarem com as cores da vitória. Todavia não esquecerei de gritar também em poema:

Humanos e cavalos (de sangue e de aço) vistos pelo público carregando cores caras

isturdia no cavaleguódromo: aquele
cavalo a quem não se-olha os dentes
cavalo de carne-e-osso (que geme)
cavalo que corre pelo dinheiro
cavalo com quem me-deleito
cavalo de puro jóquei e sangue
cavalo que corra e que plante
cavalo em quem manda o sêmen
cavalo de pista (apostas na grama)
cavalo que corre o perde-ganha
cavalo pra quem o jóquei é pequeno
cavalo de bilhete dopado o prêmio
cavalo que corre esporte os dividendos

no carródromo agoraqui: este
cavalo que corre a grama em asfalto
cavalo de borracha fibra de carbono e aço
cavalo com que patrocínios se-contratam
cavalo que corre por tecnologia alta
cavalo de teste de equipamento raro
cavalo que come na bolsa de aposta
cavalo a quem se-paga salário (luvas)
cavalo de transmissões pista-satélite
cavalo renascido de outras matérias
cavalo que continua graxa a aposta suja
cavalo que presenteará outras guerras
cavalo de aposta pela reta pro futuro

já pagamos todos o ingresso
jogamos na bolsa de apostas
vamos ao jogo: comecem logo
que temos essa vontade
de humanos de jogo
lancem os dados
então, lançados

segunda-feira, 15 de março de 2010

Em memória do poeta H., que, não mudo (dobrado o mundo), é Dobal.

Um poema: a poesia colhida do campo humano

àqueles que
te-desconhecem
o sabor: a tua messe!

(Onde é semeada de nova mente a palavra.)